A ELEGANTE MULHER GATO

Desde sua aparição na revista em quadrinhos número #1 do Batman, Selina Kyle, também conhecida como Mulher-Gato se mostrou uma das personagens mais interessantes da história, se não a mais interessante do universo criado por Bob Kane um ano antes, em 1939. Nas primeiras histórias o figurino da ladra ficou marcado por vestidos rodados com decote e salto alto. o primeiro deles foi verde escuro e à medida que o personagem ganhava características mais detalhadas e destaque maior no universo de Batman, os vestidos ganharam outras cores, capa e máscara. A primeira máscara que a Mulher-Gato usou era uma réplica de uma cabeça de gato preta, feita toda de pelos. Com o aparente desconforto, as histórias seguintes adaptaram o disfarce e colocaram a máscara tampando só a parte dos olhos. Todos seus acessórios fashion tinham alguma utilidade e mantinham a função dupla de enfeitar e armar a Mulher-Gato. A sensualidade sempre foi explorada pela personagem, que por várias vezes usou seu charme e sex appeal para por em prática seus planos de roubo. Nos inocentes anos 40 o decote era a única forma usada pelos quadrinistas para mostrar essa sensualidade, logo apareceu as fendas nos vestidos, a cor preta, o roxo, as luvas, o chicote e por fim o collant de couro justo ao corpo, que hoje é o traje conhecido pelo mundo. Houve até um arco de histórias HQ, em que Selina Kyle era prostituta, abusando da sensualidade e do sexo para conquistar informações dos clientes. Em sua própria revista Catwoman #1 ficou provado que além da habilidade para se disfarçar e roubar, ela era mestre na arte de seduzir. Quando apareceu na TV (interpretada por Julie Newmar) e no cinema esta característica também veio com a personagem, com uma fantasia adequada para cada adaptação, sendo que a versão para o cinema de Tim Burton no filme "Batman - O Retorno (1992)" é a imagem mais marcante pertencente à cultura pop.

A Mulher-Gato do diretor foi interpretada por Michelle Pfeiffer, eternizada num collant preto de látex. A figura de uma sado-masoquista é a melhor forma comparativa de descrever Selina Kyle nesse filme, com seu chicote dominatrix, ela usa os trejeitos felinos para se desdobrar em poses super sensuais durante suas lutas com Batman. Na história do longa, Selina constrói seu disfarce a partir de retalhos que tinha em casa, o que acrescenta um visual alternativo a imagem da Mulher-Gato, largos pontos em linha branca aparecem em toda fantasia. Na adaptação de Tim Burton, a personagem ganha uma origem sobrenatural após ser ressuscitada por um bando de gatos, e passa a ter habilidades felinas assim como o comportamento e os golpes de combate característicos e animalescos. Talvez por isso os movimentos de Pfeiffer tenham ganhado mais mistério, bizarrice e sensualidade. Com olhos encantadores e um gemido "miau" saído de lábios vermelhos, essa versão foi a que marcou os fãs e os não apaixonados por quadrinhos, que em sua maioria teve o primeiro contato com a ladra felina assistindo ela nas telonas em 1992.

Mais tarde em 2004 resolveram fazer um filme estrelado exclusivamente pela Mulher-Gato, fora do universo de Batman e escolheram a atriz Halle Berry para interpretar o papel. As qualidades como atriz e a extrema beleza de Berry não foram suficientes para segurar o personagem e salvar ele das críticas pesadas ao filme. Um roteiro fraco, um enredo místico demais e totalmente fora dos padrões de qualidade de uma super produção, o filme flopou nas bilheterias e ninguém gostou ou se lembra que essa versão existiu. Talvez por não ser Selina nesse filme, muitos tentam esquecer as rosnadinhas de Halle, ou nem consideram a personagem Patience Phillips relevante em toda história da ladra. O figurino horroroso apelou de vez para sensualidade exposta e vulgar da anti-heroína, tentando mostrar o máximo possível do corpo escultural da atriz. Feito todo de couro, a fantasia era composta por um top, uma calça rasgada cheia de fendas, máscara, luvas compridas acima dos cotovelos e garras de diamantes na ponta dos dedos. Considerada uma atrocidade se comparada aos outros trajes usados pela personagem nos quadrinhos, na TV e no cinema.

Quando Christopher Nolan colocou as mãos no universo do Homem-Morcego em "Batman Begins (2005)", ele optou por um aspecto mais realista e sombrio para recontar a história de origem do super-herói. Após o sucesso da sequência "Batman - O Cavaleiro das Trevas (2008)", parte por conta da atuação impecável de Heath Ledger como Coringa e outra por conta do roteiro de ação incrível, Nolan voltou esse mês de julho aos cinemas dirigindo o final da trilogia, e escolheu Anne Hathaway para interpretar sua Selina. A figurinista Lindy Hemming, responsável pelo novo visual da Mulher-Gato, disse que procurou inspiração na personagem de TV dos anos 60, interpretada por Julie Newmar. A silhueta minimalista da época serviu de base para as roupas casuais e para o uniforme da Mulher-Gato. Como parte dos utilitários, nessa versão o salto da bota tem uma espécie de lâmina embutida pronta para ser usada, isso além de um cinto customizado com acessórios em miniatura que a auxiliam nos roubos. A figurinista explicou para o site Omelete o uso das orelhas de gato como parte do figurino:

• "Chris e eu tentamos imaginar por que uma mulher moderna, por dentro da última moda e cool estaria usando orelhas [risos]. A verdade é que são óculos, que ao serem levantados para cima da cabeça se parece com orelhas. Nós achamos que ficou muito cool. Adoramos o resultado. Nós passamos por tantas ideias de como poderíamos fazer aquilo dar certo. A inspiração ali veio de joalheiros ou dentistas, que usam espécies de óculos, com lentes de aumento para ver os mínimos detalhes. E trabalhando com um designer, chegamos a este óculos que serve também como visão noturna."

Como um ninja moderno, essa nova Mulher-Gato se esgueira pelo filme se mostrando charmosa e elegante, sempre quando aparece em alguma cena exibe sua personalidade forte através do diálogo afiado e muito por conta da imponente postura fashion diante de uma Gotham sitiada. Ela trás uma sensualidade pura, original, entre linhas, sem vulgaridade e exposição, aliás esse é o maior destaque dessa versão da personagem. A elegância dessa Mulher-Gato é soberana e se sobrepõe a estabelecida sensualidade das outras versões. O bom trato do figurino simples e a ótima direção de Nolan enxugaram os exageros passados, os miados, o couro, desligaram a imagem da ladra felina do sexo e do sadomasoquismo. A interpretação de Anne também contribuiu. Com apenas um olhar sedutor e um batom vermelho ela provou que era possível ser elegante, levemente sensual sem usar chicote ou mostrar alguma parte do corpo.