O CHARMOSO DE CASABLANCA

Esse ano foi lançado um box comemorativo de 70 anos de um dos maiores clássicos do cinema, Casablanca. O filme de 1942 foi transferido diretamente do negativo original para essa versão em Blu-ray intitulada Edição do 70º aniversário. Três discos compõe esse relançamento, um com o filme em Blu-ray, outro com o filme em DVD e o terceiro repleto de extras, comentários e documentários sobre o filme. Isso além de uma réplica do pôster original, um livro e quatro porta copos. Toda pompa e garbo para essa edição do filme são mais que merecidas e necessárias, além da preocupação com a qualidade muito elogiada e acima de versões anteriores lançadas em DVD e Blu-ray, essa homenagem é um presente para todos os fãs do cinema e dos clássicos.
A geração blockbuster torce o nariz para filmes como esse, aos críticos predominam as opiniões elogiosas e o culto à filmes "velhos", preto e branco, e a frente de qualquer opinião leiga existe a descrença. Será? Assistir o filme pela primeira vez é uma surpresa agradável e reassistí-lo é um prazer ainda maior. Assistir pela segunda vez é a oportunidade perfeita para se encantar com os detalhes, e ter a atenção magnetizada para sutileza das interpretações e a riqueza da produção, ser agradavelmente surpreendido por características que antes haviam passado despercebidas. O toque de suspense regido por um romance sofredor por encontros e desencontros, uma narrativa cativante com pontos chaves de humor, conspirações e intrigas, fazem desse primeiro contato uma experiência apaixonante. Casablanca é um daqueles filmes que você acaba de assistir desejando esquecer os últimos 102 minutos só para poder assistir de novo. O filme foi eleito pelo Writers Guild of America (Associação de escritores da América) como o melhor roteiro de todos os tempos, na frente de "Cidadão Kane (1941)" e o "Poderoso Chefão (1972)" estes tantas outras vezes vencedores de inúmeras listas como melhor filme. Esse titulo só prova que Casablanca é uma obra bem escrita e que por isso funciona tão bem independendo da época. É um filme atemporal. 
A figura do personagem principal é totalmente coerente a curiosidade gerada durante todo início de filme, quando finalmente Rick Blaine (Humphrey Bogart) aparece, ele está assinando um cheque com seu olhar caído e sua expressão séria, mantendo as características que nos foram  apresentadas. Rick é o esnobe, arrogante e poderoso chefe de um café americano de uma cidade marroquina, Casablanca. Um território neutro durante a segunda guerra, que refugiados da Europa se abrigam, para em seguida fugir para as Américas e se afastar de vez da repressão dos nazistas. Rick comanda um dos poucos lugares para lazer de Marrocos, o Rick's Café Américain abriga boa música, bebida e conversa. Os clientes e refugiados dividem uma vida social de fachada, zelando o clima tenso e sensível da situação vivida pela população da cidade. Em certo momento do filme um dos personagens desconfia do temperamento de Rick e seu sentimentalismo velado, mas ele nega com muita ironia e rispidez, como habitualmente. E o filme segue com seu tom de proibição, disfarçado ao som do piano de Sam (Dooley Wilson) gritos de liberdade oprimidos por parte dos frequentadores daquele lugar, e aos poucos você percebe a narrativa melindrosa que surge aos poucos e te amarra na frente da tela.
Humphrey Bogart, que foi indicado ao Oscar de melhor ator por esse papel, emprestou todo seu charme ao personagem. E que charme! Com poucos atributos físicos para se tornar um galã costumeiro de rosto forte e marcante, a figura de Bogart encanta pelos misteriosos olhos que chamam a atenção e desperta a curiosidade das mulheres. O rosto de um verdadeiro homem, a figura imponente, são características ditadas como originais à figura masculina, antigamente valorizada, mais apreciadas pelas moças de épocas passadas, ao contrário do que acontece atualmente. Bogart passava confiança, era seguro de seu poder de sedução e talvez por isso seduzia, na certeza da conquista, ao que parece esse era o segredo, ou a definição do charme. Em Casablanca o contraste entre tons de cinza, preto e branco, valoriza as marcas faciais, a penumbra do olhar e o mistério que circundam esse homem. Ah a voz! Soa tão bem aos ouvidos o tom  aveludado, de um grave apropriado, na medida. Ele é definitivamente o charmoso de Casablanca e só podia ser ele, o charmoso do cinema, para todos os outros que se seguiram.

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No decorrente drama político de Casablanca somos apresentados a Ilsa Lund (Ingrid Bergman) a tela brilha quando ela aparece, a trilha muda, toda tensão anterior desaparece para rimar com seu belo rosto.
Os figurinos de Ilsa lembram uma época em que mulheres se preocupavam em se vestir bem, era um dever, um direito a feminilidade ser cortejada pela beleza de um vestido apropriado. E deveria ser assim até hoje, ao invés do culto ao corpo e a desvalorização da vestimenta. Nesse caso deveríamos olhar para o passado e perdurar alguns hábitos. Tem coisa mais linda do que uma mulher bem vestida?
E a cena seguinte acontece:


E o romance enfim aparece na trama. O disfarce de Rick se desfaz num olhar, a figura de poder e controle desaparece quando as luzes do bar se apagam e na madrugada ele se embebeda na penumbra. Escuro, solitário, frágil, exposto, talvez uma externação do seu interior resultado desse encontro. E o mistério sobre o passado do casal aumenta. Em contraste a essa cena surgem as memórias de Rick ao lado de Ilza. Luz, vibração, sorriso, alegria, os ventos de Paris nos cabelos enquanto passeavam pelas ruas francesas a bordo de um conversível. Vemos ali o interior de Rick, a vida ao som de A Time Goes By, a complexidade daquela personalidade fica clara, a postura política, a alma com desejo de liberdade, a crença ao amor, a paixão por uma mulher. Nesse momento parece que estamos vendo um filme em cores, tamanha é a vivacidade das cenas, leves pinceladas de sentimento verdadeiro. De volta à escuridão do bar, aos segredos e as mágoas, conseguimos entender melhor o egoísmo de Rick, dentro de mais mistérios que alimentam a trama que aumentam o desejo do espectador de assistir até o último minuto do filme para descobrir tudo e se encantar com o final perfeito e mais marcante do cinema. Casablanca é o verdadeiro filme de romance, como não existem mais. Se perdeu o charme, o romantismo acabou. Hoje em dia o amor é idiota, viva a vida, o negócio é aproveitar.
Para o charme, para o amor e para lembrar Humphrey Bogart "We always get Paris".

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